Autonomia e identidade no desenvolvimento do bebê: Quais os ganhos para o campo cognitivo infantil?

Um estudo realizado pela Universidade de Montreal apontou que crianças estimuladas desde cedo a ter maior autonomia apresentaram benefícios gritantes no desenvolvimento cognitivo. Saiba como aplicá-la na primeira infância.

Autonomia: substantivo feminino definido como a capacidade de governar a si mesmo segundo os próprios meios. Se hoje somos seres autônomos, capazes de fazer escolhas, decidir, preferir isso a aquilo, comer com as próprias mãos e andar com os próprios pés, é por duas razões: a primeira porque tentamos diversas vezes, a maioria delas sem sucesso, e porque nos foi dada a oportunidade de aprender tentando sozinho. 

No momento em que uma criança chega ao mundo, é comum que ela seja a maior prioridade da família, de modo que tudo é feito para ela. De fato, todos nós quando nascemos somos completamente dependentes. Mas, com o decorrer do tempo, é preciso estimular a autonomia. Estudos científicos realizados no campo da psicologia e da pedagogia do aprendizado apontaram: crianças aprendem mais quando percebem a diferença das ações feitas com elas do que para elas.

“A partir do momento que um bebê segura sua própria mamadeira, ali já temos um sinal de que ele tem autonomia para isso, para se alimentar. Quando ele dá início a atitudes simples de desenvolvimento, como quando começa a querer segurar a colher ou a pegar a comida com a mão, também são sinais de que ele está buscando se tornar um indivíduo autônomo”, explica a coordenadora pedagógica do Colégio Salesiano Santa Teresinha, Gislene Maria Magnossão Naxara.

Um estudo divulgado em 2015 e realizado pela Universidade de Montreal, no Canadá, acompanhou 78 mães e seus respectivos filhos. As crianças foram avaliadas pela primeira vez quando tinham 15 meses e depois aos três anos. O primeiro teste foi um jogo: as mães foram convocadas para ajudar seus pequenos a realizarem uma tarefa considerada difícil, com duração de 10 minutos. Os pesquisadores registraram em vídeo e analisaram as atitudes maternas: se elas encorajaram os bebês, se tinham uma postura flexível e se respeitavam o ritmo e as dificuldades de cada um. Depois de um tempo, os cientistas idealizaram jogos adaptados para que pudessem mensurar a memória e a capacidade infantil de trabalhar vários conceitos cognitivos de uma só vez. Os que se deram melhor foram aqueles cujas mães incentivaram e preferiam instruir em vez de completar os desafios para eles.

O estudo mapeou benefícios significativos na função executiva, considerada um dos pilares mais importantes da cognição, na memória, capacidade de resolver problemas, raciocínio, flexibilidade e planejamento para realizar funções.

COMO INCENTIVAR A AUTONOMIA E A INDEPENDÊNCIA DAS CRIANÇAS DESDE CEDO?

É claro que os tipos de incentivos e funções irão depender da faixa etária e das características de cada criança, mas há algumas atitudes que devem ser estimuladas. Uma criança de 2 anos não conseguirá se vestir sozinha, mas a mãe poderá pegar suas mãozinhas e ensinar como se colocam meias, que é uma tarefa relativamente fácil. “É muito importante mostrar a ela o quanto ela é capaz e sempre motivá-la. Num primeiro momento, sempre com a supervisão dos pais ou responsáveis E depois, sozinha, sem a supervisão”, explica Gislene.

Uma outra estratégia é oferecer pequenas possibilidades, como perguntar à criança qual roupa ela gostaria de vestir – sempre com poucas opções, geralmente duas, para não confundi-lo. Dessa forma, aos poucos, a criança vai percebendo que não deve ter uma
postura passiva e que sua voz e opiniões também importam.

Para que os pais e responsáveis consigam trabalhar melhor a autonomia e a independência dos pequenos, listamos abaixo 7 formas de incentivá-los nessa deliciosa e desafiadora busca. Confira:

  • Coloque a criança em situações desafiadoras. Por exemplo, se o brinquedo foi colocado ou jogado longe, sempre pergunte: ‘E agora, como vamos pegá-lo?’. Mesmo que ela ainda não fale ou entenda palavras, é capaz de perceber a entonação das frases. O desafio, por menor que seja, possui papel fundamental na capacidade que a criança irá adquirir para gerar conflitos internos e externos.
  • A frustração é importante. Embora o desejo dos pais seja de que o filho nunca se frustre, se entristeça ou se sinta mal por determinada situação, é fundamental que ele aprendam desde cedo a lidar com esse tipo de sentimento. Portanto, em vez de fazer para o seu filho, tente direcioná-lo para executar a função que queira da forma certa, e fale coisas do tipo: ‘Já tentou dessa outra forma? E dessa? Talvez seja melhor por causa disso ou daquilo etc.’.
  • Permita que a criança faça pequenas escolhas e se sinta sempre como parte de algo maior. Convide-a para ajudar, mesmo que sejam funções pequenas, como pegar uma colher, secar um pote depois de lavado etc. A criança passará a entender que pode e deve ajudar, o que pode ser um dos pontapés iniciais para valores muito importantes.
  • Mostre ao seu filho que ele é responsável pelas próprias coisas, pelo cuidado, organização e bom estado. Portanto, sempre deixe claro que, após brincar, os brinquedos precisam ser guardados, e que se forem levados para o quintal, piscina ou escolinha, precisam ser limpos. O mesmo cuidado deve acompanhar o material escolar, suas próprias roupas etc.
  • Sempre incentive a criança a falar, se ele precisa de algo e está com vergonha de pedir, o que é uma atitude muito comum em crianças que são mais introspectivas ou que estão em ambientes muito cheios, com pessoas desconhecidas. A criança precisa aprender a agradecer, pedir ‘por favor’ e lidar com os outros.
  • Não corrija, principalmente na fala, porque isso o deixará ainda mais inseguro para verbalizar o que está sentindo e o que realmente tem vontade. E a insegurança é um dos maiores empecilhos para a construção da autonomia.
  • Durante as brincadeiras diárias, deixe que a criança escolha o que quer fazer por um curto período de tempo. Isso a ajudará a se sentir mais confiante e entender que a hora de brincar também é um espaço de diálogo, que ela poderá apresentar os próprios gostos e preferências.

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